Por Gabriela Gaspar

“Há uma desconfiança profunda em relação à realidade”. É assim que o ator Bendix Dethleffsen define King Size, uma peça de teatro que transita entre o mundo real e o onírico. Em um debate sobre o espetáculo ocorrido no Itaú Cultural, na última terça (6), tanto Dethleffsen quanto sua companheira de palco, Tora Augestad, contaram um pouco sobre suas experiências e o processo de criação do espetáculo.

No palco, a linha tênue entre realidade e sonho se dá pela forma cômica com que os personagens agem, seja interpretando músicas clássicas de Schumann (1810 – 1856) deitados na cama, ou cantando The Jackson 5 com vozes líricas. O diretor, assim, rompe com prática usual, já que “as músicas populares são cantadas com postura dos rituais de conserto e as músicas eruditas de forma descontraída e inusitada”, aponta o ator.

A experiência proposta a cada espectador é única, pois as relações entre os personagens e até mesmo a história deve ser imaginada por cada pessoa individualmente. Como é uma peça em que toda comunicação é feita por meio da música, os relacionamentos e diálogos ficam subentendidos, mesmo que sejam claros os sentimentos de melancolia e solidão.

Até mesmo o nome King Size é relativizado pelo artista: pode ser referência à cama no palco ou “talvez sejam os sonhos que sejam King Size”, afirma Augestad.

O que torna a obra tão singular é a montagem do espetáculo, a simplicidade do cenário e a direção de Christoph Marthaler. “No começo os ensaios eram mais improviso sendo que somente o título e o cenário da peça foram pré-estabelecidos”, conta Dethleffsen. A forma de trabalho de Marthaler tem clara influência da sua profissão de músico e da escola Jacques  Lecoq, que frequentou em meados de 1968.

De acordo com os atores, a influência de Lecoq é evidente porque eles têm a impressão de que podem fazer tudo, conta a atriz. “Apesar disso, Marthaler é muito detalhista e busca isso através de uma relação muito democrática conosco, sem expor nenhum artista. Seu método é muito eficiente”, diz ainda.

Já sua carreira musical como oboísta e flautista faz com que uma das características do espetáculo seja a de que “a música tem um papel central na peça e é o que dá o tom dos sentimentos”, diz Augestad. Apesar da simplicidade do palco, em que há apenas quatro personagens que interagem entre si e o cenário de um quarto em tons de azul, a música foi usada de forma complexa.

Ao tratar as crises existenciais e as relações humanas de forma cômica e poética, King Size é uma peça que, aos olhos dos próprios atores, os detalhes da visão artística trazem esclarecimento e a beleza da obra fica ainda mais evidente.

 

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