por Gui De Rose
Baculejo, no dicionário, é uma gíria que significa revista policial, geralmente feita em local público, com a finalidade de se buscar algo no corpo de alguém. Nesse procedimento, o suspeito normalmente é colocado de braços e pernas abertas contra uma parede.
Já para o Coletivo Riddims, composto por artistas urbanos-caboclos periféricos de Fortaleza, Baculejo nomeia um inspirador trabalho cênico, selecionado pela curadoria da MITbr – Plataforma Brasil para integrar a programação deste ano.
Ao entrar no hall do Mezanino do SESI-SP para assistir ao espetáculo, fui recepcionado com uma dose da cachaça artesanal do coletivo chamada Baculejada. Essa dose eu repeti algumas vezes e, quando fiquei tímido para repetir por uma enésima vez, pedi a um amigo, que não bebe, buscar mais um pouco para mim. O sabor era delicioso, com notas de capim santo e gengibre, de forma que, quando entrei junto com o público, para assistir o espetáculo, já estava literalmente “baculejado”, sob a animação de diversas microdoses daquela cachaça que acabara de conhecer.
O espetáculo é uma festa. Ou melhor, é um ritual. Na verdade, as duas coisas. Um ritual que oscila entre o sagrado e o profano, com cânticos religiosos e descidas dos intérpretes até o chão, sempre com muita sensualidade, cada um carregando em seu corpo e na sua dança sua própria identidade.
O sentido de coletivo estava ali também. Em cena e na ficha técnica. Três intérpretes criadores que jogam em cena e constroem o espetáculo juntos. Erick Flor também dirige Baculejo. Miky Vitorino confecciona os adornos utilizados no trabalho cênico. RAFFAR YGá assina o dramaturgismo. Tudo ao som do incrível DJ Coreano, artista periférico, com mixagens incríveis, como a que mistura falas cirurgicamente selecionadas da deputada federal Erika Hilton com batidas de músicas brasileiras.
Em Baculejo, por meio da dança e da música cantada ou mixada, o coletivo cearense reflete sobre sua ancestralidade e exalta a diversidade nacional com referências afro-indígena, periféricas e LGBTQIAPN+. Durante o espetáculo, o público também é convidado a dançar e se misturar aos intérpretes, até acende vela e faz prece.
Resultado: ao sair do espetáculo, meu estado era de alguém que de fato passou por um baculejo, aquele da definição do dicionário mesmo, pois tentava processar tudo que aconteceu e sem saber definir ao certo o que vivenciei ali. Mais do que um espetáculo, Baculejo foi uma experiência, regada com cachaça, música e muito afeto.
Este texto é uma produção para as Escritas Primordiais, da Prática da Crítica, no eixo Olhares Críticos da 10ª MITsp. A atividade é coordenada por Rafael Ventuna, com supervisão de Sayonara Pereira e produção de Alice Mogadouro.
Gui De Rose é ator, licenciado em Letras Português pela Universidade de Brasília (UnB), tecnólogo em Comércio Exterior pela Unisul, especialista em Relações Internacionais pela UnB, servidor público federal e analista de comércio exterior.