Por Gabriela Gaspar            

“Você tem um minuto para ouvir a palavra?” A apresentadora de TV Astrid Fontenelle participou, no último domingo (4), da irônica ação de Nayse López, que replicava a forma evangélica de conquistar público em plena avenida Paulista.  Quando assumiu o microfone, a jornalista optou por ler Água Viva, de Clarice Lispector.

Segundo ela, a experiência foi tão enriquecedora e o retorno da sua transmissão tão positivo que serão realizadas leituras frequentes com o intuito de um impacto maior e mais duradouro. “Eu acho que isso devia virar calendário na avenida Paulista, porque isso é só começo”, disse Fontenelle. “Usei minha imagem para divulgar o evento, fiz transmissão ao vivo e alcancei 6.200 pessoas. A grande maioria eu disponibilizei. A literatura e a arte contagiam”, contou ainda.

O projeto de López atraiu a atenção das curadoras da sessão Olhares Críticos da 5ª MITsp – Mostra Internacional de Teatro de São Paulo. Você tem um minuto para ouvir a palavra? teve uma primeira versão no Rio de Janeiro no Festival Panorama, em 2017, quando contou com aproximadamente 12h de leituras ininterruptas.

Já aqui em São Paulo, o evento aconteceu no último domingo, na avenida Paulista, quando a via é fechada para carros até às 18h. Essa versão também contou com leitura públicas e durou 6h30, tendo uma hora dedicada ao debate sobre a importância da disseminação do conhecimento.

A proposta do projeto, segundo López, é “incentivar as pessoas a ter mais contato com a cultura, utilizando a mesma estratégia da pregação religiosa de pregar suas ideias pela rua, nesse caso, lendo textos sobre tolerância, liberdade, censura, arte e feminismo”.

Além de Fontenelle, a própria Nayse López e as curadoras de Olhares Críticos da 5ª MITsp, Daniele Avila e Luciana Romagnolli, leram livros impactantes como Parque Industrial, de Patrícia Galvão, O Rei da Vela, de Oswald de Andrade, e Entrevista, da jornalista Eliane Brum, entre outros. A escolha dos livros foi em torno de assuntos polêmicos como a desigualdade social, machismo, sexualidade e censura.

Com o atual momento político brasileiro de incertezas, insatisfações e extremismos, os temas lidos se encaixaram perfeitamente nos dias de hoje, independentemente de sua data de lançamento.

A escolha de ler livros na rua ao invés de apenas discorrer sobre suas ideias é a de que “é preciso valorizar esse ato político de ler e de compartilhar livros”, conta López. Por ter também a formação jornalística, ela acredita que a criticidade se baseia no conhecimento por meio da leitura, dizendo também que “o livro é a coisa mais essencial na vida de uma pessoa”.

O impacto dessas leituras conseguiu com que diversas pessoas parassem para ouvir o que estava sendo dito, além de que o público também foi atraído pelo cenário peculiar da intervenção, um sofá colocado na calçada, frente a cadeiras de plástico disponíveis aos transeuntes.  Foi sem dúvida um acontecimento curioso ao olhar alheio e enriquecedor ao ouvido leigo.

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