Por Letícia Manso

“Eu sou obcecado pelas coisas impossíveis no teatro”, afirma Krystian Lupa, um dos maiores nomes das artes cênicas contemporâneas. “Sempre estou interessado em superar as capacidades humanas, fazer algo maravilhoso, levitar”, completou.

O diretor polonês participou de uma entrevista pública realizada pela 5ª MITsp – Mostra Internacional de Teatro de São Paulo, na qual revelou detalhes de seu processo criativo e de sua personalidade. O evento ocorreu no último sábado (10), no Sesc Pinheiros, e atraiu fãs do artista, que escutavam atentamente à tradução simultânea de suas respostas.

O espetáculo Árvores Abatidas, dirigido e roteirizado por Lupa com base no romance homônimo de Thomas Bernhard, estava em cartaz na mostra e foi extremamente elogiado durante a entrevista. “O livro foi transferido por ele para o teatro da forma mais completa. Ele conseguiu mudar a linguagem sem perdas, pelo contrário”, afirmou Denise Stoklos, atriz, diretora e dramaturga brasileira.

Na verdade, essa é uma das especialidades do diretor. Grande parte de seu trabalho se dá a partir da adaptação de romances, muitos deles escritos por Bernhard.

Uma das questões ao polonês foi o motivo de optar por adaptar textos e não trabalhar com dramaturgias prontas. “Tenho problemas ao ler textos dramatúrgicos, pois os diálogos não são muito reveladores e lineares. As conversas verdadeiras são muito mais bizarras”, afirmou, despertando o riso do público.

Sua fixação pelo autor também foi abordada e, novamente, ele respondeu com bom humor: “Já cheguei a pensar que Bernhard era um assunto esgotado para mim. Pensei que ia terminar com ele. Mas os textos continuavam chegando. Infelizmente, ele escreveu muitas coisas”, brincou.

De acordo com Lupa, a conexão entre os dois vem do fato de Bernhard expor os pensamentos que as pessoas não tem coragem de dizer, com pensamentos vergonhosos que todos secretamente têm. “Nossa cultura, e consequentemente nós mesmos, somos muito mentirosos. Mas ele odeia isso.”

A respeito do processo criativo dessa peça, o diretor relatou o contato estabelecido entre o elenco e as pessoas reais retratadas no livro Árvores Abatidas para a confecção dos personagens, o que deixou os atores fascinados pela história. “A fascinação é o melhor método para um trabalho intenso”, assegurou.

Além da fascinação, seu método também inclui a liberdade de criação do elenco. Foi dito e repetido que ele nunca espera a obediência total dos atores em relação a seus pedidos. Porém, defende a necessidade de reflexão solitária após o ensaio, para que a criação do dia não seja perdida.

Ao final da entrevista, Lupa comentou o momento político-social polonês. Está no poder um governo conservador e autoritário que dificulta a realização de Árvores Abatidas. Ao mesmo tempo, os jovens têm recorrido ao teatro com mais frequência, em busca “do alimento desconhecido, do motivo de ser humano”, segundo ele.

Sobre o Brasil, o diretor teve uma visão positiva: “Não acredito em crise cultural num país com esse público que me recebeu. Foi uma recepção intensa, inteligente e bem-humorada que me comoveu muito”.