MITsp 2018

Em sua quinta edição, de 1 a 11 de março de 2018, a MITsp – Mostra Internacional de Teatro de São Paulo apresenta um programa de espetáculos com nomes de peso no contexto internacional, amplia sua atuação por meio dos eixos Olhares Críticos e das Ações Pedagógicas, este último chegando a regiões descentralizadas de São Paulo, e lança um novo eixo: a MITbr – Plataforma Brasil.

A despeito das dificuldades de manter um festival no contexto de instabilidade econômica e política que afeta todos os setores da cadeia produtiva, com especial impacto no campo da cultura, a MITsp levou aos palcos 43 espetáculos de países como Chile, Argentina, França, Alemanha, Polônia, Líbano e África do Sul desde sua primeira edição, em 2014, alcançando aproximadamente 80 mil espectadores.

Antonio Araújo, diretor do Teatro da Vertigem e professor da ECA-USP, e Guilherme Marques, diretor geral do CIT-Ecum/Centro Internacional de Teatro Ecum, idealizadores da mostra e, respectivamente, diretor artístico e diretor geral de produção da MITsp, continuam investindo em espetáculos e ações capazes de questionar os limites entre as artes cênicas e outras linguagens. Além disso, são propostas artísticas que tentam se aproximar, de diversas formas, da complexidade do mundo em que vivemos.

 

Mostra de Espetáculos

Os espetáculos que compõem a MITsp 2018 são todos inéditos no Brasil – alguns desses diretores, apesar de fundamentais no panorama internacional, nunca trouxeram trabalhos ao país. É o caso do Artista em Foco desta edição, o francês Joris Lacoste, que assina o espetáculo de abertura: Suíte nº2. Em 2007, o encenador criou a Enciclopédia da Fala, projeto envolvendo profissionais de múltiplas áreas, entre eles, atores, músicos e linguistas, para pesquisar formas de oralidade. Em Suíte nº2, cinco performers reproduzem palavras extraídas de contextos reais.

Aos 74 anos, o polonês Krystian Lupa, diretor de Árvores Abatidas, é considerado um dos grandes mestres das artes cênicas contemporâneas. O espetáculo, adaptação do romance de Thomas Bernhard, traz reflexões sobre o papel da arte e a liberdade. Tanto Lacoste, Artista em Foco, quanto Lupa terão programações especiais distribuídas nos eixos Olhares Críticos e Ações Pedagógicas, como entrevistas públicas e workshops, para que o público brasileiro possa conhecer com mais profundidade as trajetórias dos dois artistas.

No musical King Size, o suíço Christoph Marthaler, diretor com projeção consolidada na Europa, alia música e dança numa peça cujo repertório vai de Schumann a The Jackson 5.

O dramaturgo e diretor suíço Boris Nikitin propõe, com o músico eletrônico e performer queer Julian Meding, um Hamlet enigmático, que mistura realidade e ficção, capaz de despertar sentimentos contraditórios no espectador, ora de cumplicidade ora de repulsa.

Da Argentina vem Campo Minado, da diretora, escritora e performer Lola Arias. Conhecida por seus trabalhos de teatro documentário, a diretora envereda por um episódio que ainda é uma ferida em seu país, a Guerra das Malvinas (1982). Constrói a montagem com seis veteranos do conflito, combatentes em lados opostos, que agora se veem trabalhando juntos, reconstruindo e ressignificando as experiências de guerra.

Tendo como ponto de partida a destruição da cidade de Palmira pelo Estado Islâmico em 2015, os performers Bertrand Lesca, francês, e Nasi Voutsas, de origem grega, desestruturam os limites do humor, explorando de forma simbólica a violência, a vingança e a política da destruição. Palmira estreou no Festival de Edimburgo de 2017 e foi premiado com o Total Theatre Award 2017 para Inovação, Experimentação e Exploração de Formatos. O espetáculo também recebeu outros prêmios, como o Stockholm Fringe 2017 Grand Prix, o Mess Festival Prize (BE Festival) e o Best of BE Festival Award, além de ter sido incluído no “The Top 10 The Guardian’s Theatre of 2017”.

País Clandestino é um processo colaborativo que reúne cinco diretores e dramaturgos entre 30 e 35 anos: Florencia Lindner (Uruguai), Jorge Eiro (Argentina), Lucía Miranda (Espanha), Maëlle Poésy (França) e Pedro Granato (Brasil). Eles se conheceram durante uma residência artística em Nova York, em 2014 e, desde então, maturam um espetáculo em registro documental, que inclui em sua dramaturgia dispositivos tecnológicos como Skype e e-mail, utilizados na elaboração da montagem.

Da mesma geração dos criadores de País Clandestino, Selina Thompson sempre se inquietou com a pergunta sobre sua origem. A artista partiu da Inglaterra, onde mora, em direção a Gana e à Jamaica, para refazer uma das rotas do comércio de escravos, em busca de respostas a questões ancestrais. sal. é fruto dessa jornada, de uma ida a um passado que Selina não vivenciou, mas que esteve sempre presente na sua pele e, principalmente, na reação das pessoas à sua negritude.

 

Olhares Críticos

As Reflexões Estéticos-Políticas, um dos principais braços do eixo Olhares Críticos, discute “O estatuto da arte no Brasil contemporâneo: liberdade, alteridade, mediação”. A partir desse tema chave, que perpassa debates sobre os limites da arte e a censura, serão realizadas três mesas redondas, uma conversa e uma masterclass.

Além das atividades que acontecem desde a primeira edição da MITsp, como os Diálogos Transversais, em que profissionais de diversos campos refletem sobre os espetáculos ainda no espaço do teatro, após a apresentação, ou o Pensamento-em-processo, conversa com os artistas sobre o percurso criativo dos espetáculos e dos seus trabalhos, algumas outras ações ganham destaque. Joris Lacoste e Nuno Ramos – que idealizou a performance A Gente Se Vê Por Aqui, realizada durante 24 horas – dialogam, tendo como mediadora a jornalista e crítica Maria Eugênia de Menezes. Krystian Lupa será entrevistado publicamente pelo encenador Aderbal Freire-Filho e pela atriz, diretora e dramaturga Denise Stoklos, também com mediação de Maria Eugênia de Menezes.

Durante o festival, há lançamentos relevantes inclusive no audiovisual, como a estreia latino-americana do filme Tribunal Congo, projeto do encenador suíço Milo Rau, que constitui originalmente uma peça e um filme e investiga a guerra que já deixou mais de seis milhões de mortos no Congo. Já no campo da literatura, o selo N-1 lança no Brasil a versão de um texto fundamental para pensar a negritude: Crítica da Razão Negra, de Achille Mbembe, além dos cordéis O fardo da raça, também de sua autoria, e Eu, um crioulo, de José Fernando Azevedo.

Os espetáculos, como já é de praxe na MITsp, serão analisados por um grupo de críticos com atuação em vários lugares do Brasil. Os textos terão distribuição gratuita nos teatros no dia seguinte a cada estreia e serão publicados no site do festival. Ao final da mostra, os críticos vão debater a programação desta edição, procurando refletir sobre a cena contemporânea. Na revista Cartografias, publicada também desde a primeira MITsp, há algumas novidades: dois textos que procuram tecer pontes e relações entre os espetáculos da programação, chamados de “Textos de Atravessamento”, e a publicação de um Dossiê, que passa a ter periodicidade anual. Nesta edição, o tema é “Curadoria em Artes Cênicas”, uma importante reflexão sobre um campo pouco discutido no país, com seis abordagens de curadores em atuação no Brasil e na Europa.

 

Ações Pedagógicas

Pela primeira vez, as Ações Pedagógicas espalham-se para além do centro de São Paulo e chegam a regiões como Cidade Tiradentes e Brasilândia, consolidando a missão fundamental de possibilitar intercâmbios e trocas entre os criadores que participam da MITsp com espetáculos, convidados especiais e os artistas brasileiros.

A encenadora alemã Susanne Kennedy, que no ano passado participou da mostra com o espetáculo Por Que o Senhor R. Enlouqueceu?, volta ao festival para uma residência artística com foco nas novas formas de linguagem verbal aliadas à precisão das expressões corporal e vocal. Krystian Lupa, pela primeira vez no Brasil, vai compartilhar seu processo de criação de uma obra com 20 jovens intérpretes e encenadores durante um workshop de cinco dias. Ainda participam das Ações Pedagógicas os encenadores Joris Lacoste, Lola Arias, Boris Nikitin, além dos cinco criadores de País Clandestino: Florencia Lindner (Uruguai), Jorge Eiro (Argentina), Lucía Miranda (Espanha), Maëlle Poésy (França) e Pedro Granato (Brasil). Cada um dos workshops possui um escopo diferente, tendo como base os trabalhos desenvolvidos por cada artista.

Os performers Bertrand Lesca e Nasi Voutsas do espetáculo Palmira, vão conduzir um workshop prático de dois dias com temas que sobressaem no espetáculo, como o conflito, a frustração e a reação diante de uma violência. Pela primeira vez na MITsp, a atividade será realizada numa ocupação, a Ocupação Independente Aqualtune, edifício do antigo Colégio Butantã, habitado por quase 30 famílias há cerca de dois anos.

O diretor da Companhia de Teatro Heliópolis (SP), Miguel Rocha, organiza um laboratório teatral com seis encontros voltado apenas a imigrantes e refugiados. A intenção é oportunizar a visibilidade aos trabalhos artísticos de estrangeiros que moram no país. A atividade será na Casa do Povo, no Bom Retiro.

Outros destaques são os workshops “Des-normatividade: possibilidades criativas de expressão”, com a dramaturga e encenadora sueca Liv Elf Karlén, autora do livro Mais Que Isso – Pensamento sobre Atuação Gênero-curiosa, e “Técnicas de feedback e mediação em processo criativo”, com o belga Georg Weinand. A atividade visa a oferecer ferramentas para que profissionais que acompanham a elaboração e o desenvolvimento de uma performance ou de um espetáculo possam ser assertivos e contribuir para o aperfeiçoamento artístico do trabalho. Outras duas oficinas, uma sobre poéticas não-verbais e outra sobre convívio e performatividades urbanas, serão oferecidas por artistas brasileiros.

Há ainda a oficina conduzida pela artista e produtora Iva Horvat, que vai discutir a internacionalização de espetáculos. Esta iniciativa possui relação com o mais novo eixo da MITsp, a MITbr – Plataforma Brasil.

 

MITbr – Plataforma Brasil

Ao lado da Mostra de Espetáculos, dos Olhares Críticos e das Ações Pedagógicas, a MITbr – Plataforma Brasil se estrutura como um novo eixo da MITsp. Desde a primeira edição do evento, Antonio Araújo e Guilherme Marques já pensavam como poderiam fomentar a visibilidade da produção nacional no exterior. Somente nesta edição, porém, a iniciativa pôde começar a ser concretizada.

Com curadoria de Christine Greiner, Felipe de Assis e Welington Andrade, a MITbr funcionará neste primeiro ano em caráter experimental, como um projeto piloto, com 11 produções de teatro, dança e performance. Integram a programação os espetáculos: Caranguejo Overdrive (Aquela Cia. de Teatro, Rio de Janeiro – RJ), Leite Derramado (Club Noir, São Paulo – SP), Dinamarca (Grupo Magiluth, Recife– PE), Canto Para Rinocerontes e Homens (Teatro do Osso, São Paulo – SP), Vaga Carne (Grace Passô, Belo Horizonte – MG), Hotel Mariana (Munir Pedrosa, São Paulo – SP), Nós, Os Outros Ilesos (Carolina Mendonça, São Paulo – SP), DNA de DAN (Maikon K, Curitiba – PR), De Carne e Concreto (Grupo Anti Status Quo Companhia de Dança, Brasília – DF), Procedimento 2 Para Lugar Nenhum (Vera Sala, São Paulo – SP), A Emparedada da Rua Nova (Eliana de Santana, São Paulo – SP) e ainda os ensaios abertos dos espetáculos Imprevisível (Núcleo de Improvisação/Zélia Monteiro, São Paulo – SP) e Riso (Key Zetta e Cia, São Paulo – SP) Curadores de festivais nacionais e internacionais vão assistir às apresentações, também abertas ao público.